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“Preparando-se para Concursos”, de autoria de Álaze Gabriel.
Autoria:
1. Ivan
Castelar Depto. de Economia Aplicada/UFC;
2. AlexandreWeber
Aragão Veloso CEDEPLAR/UFMG;
3. Roberto
Tatiwa Ferreira Depto. de Economia Aplicada/UFC;
4. Ilton
Soares University of Pennsylvannia;
RESUMO
Este
trabalho teve como objetivo examinar o papel dos fatores determinantes da
aprovação em um concurso público. Tendo como amostra dados de um concurso
realizado para o Banco Nordeste do Brasil, no qual concorreram 232.308
candidatos, e usando um modelo logit, as principais conclusões encontradas
foram que renda familiar, tipo de educação, ser originário de região
metropolitana, idade e ter cursado escola básica privada, são fundamentais para
a aprovação do candidato. Enquanto que baixa renda pessoal e ter cursado apenas
o ensino médio diminuem a chance do candidato ser aprovado. Os resultados
reiteram, portanto, um ciclo vicioso de concentração de renda, o que pode ser
extremamente danoso para uma região pobre como o Nordeste do Brasil.
Palavras-chave:
Modelo Logit; Concurso Público; Mercado de Trabalho
1.
INTRODUÇÃO
A
instituição do concurso público para provimento de cargos no aparelho do Estado
Brasileiro tem se constituído num forte atrator de recursos humanos desde
meados do século passado. Assim, por este meio, uma elite egressa da classe
média projetou-se na conformação da burocracia estatal brasileira.
Esta
atração pode ser explicada por alguns fatores. Um deles é o fato de o setor
público pagar melhores salários do que os praticados em níveis similares da
iniciativa privada. Existem ainda, atrelados ao emprego público, benefícios
indiretos tais como plano de saúde, duração das férias e previdência
diferenciada. Outra explicação para esta atração é a de que a alocação no setor
público proporciona um maior grau de segurança quanto à permanência no emprego.
O
objetivo deste trabalho, por conseguinte, é o de investigar os fatores que
levam determinadas pessoas a serem aprovadas em concursos públicos em
detrimento de outras. Ou, dito de outra forma, indaga-se se existem fatores
socioeconômicos que aumentam as chances de uma pessoa ter melhor desempenho no
concurso. Mais especificamente, investiga-se se a renda, o nível de educação
acima do exigido pelo concurso e outros fatores sócio-econômico implicam em
maiores chances de aprovação. Para tanto, fez-se uso de um estudo de caso com
base em dados de um concurso público para provimento de cargo administrativo de
nível médio para o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), realizado no ano de 2003.
Quanto
ao caso estudado, tem-se a particularidade de ter sido um concurso para uma
instituição localizada em uma região de baixa renda, quando comparada às regiões
Sudeste e Sul do Brasil. Isto reforça a necessidade de entender o que explica a
aprovação de um candidato, pois, de forma patente, a região Nordeste
ressente-se de oferta de vagas de trabalho atrativas. Assim, se os candidatos
provenientes de famílias de melhor situação financeira tiverem maiores chances
de serem aprovados, poderá existir um círculo vicioso de concentração de renda,
o qual se torna mais grave em uma região pobre. Na sequência do trabalho essas
questões serão devidamente desenvolvidas seguindo a estrutura descrita abaixo.
Além
desta introdução, na seção 2, apresenta-se uma breve revisão da literatura
sobre o problema. Na seção 3 discute-se a base de dados e na seção 4 expõe-se a
metodologia adotada. Na seção 5 são apresentados os resultados empíricos
obtidos; e, finalmente, na última seção são apresentadas as considerações
finais.
2.
REVISÃO DA LITERATURA SOBRE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO
O
contexto teórico no qual pode ser enquadrado o desempenho de candidatos num
concurso é relativamente amplo. As abordagens tradicionais descrevem este
processo a partir de uma função de produção, em que o produto é o resultado do
concurso, ou a nota do candidato, e os insumos são as variáveis que influenciam
o desempenho (Hanushek 1986).
Outro
vertente no qual o problema pode ser enquadrado é o da teoria microeconômica do
consumidor, em que a equação que determina o resultado no concurso e a sua
estática comparativa podem ser derivadas a partir de um problema de escolha
entre consumo de bens, tempos de estudo, e trabalho (Fair 1978).
Becker
(1974) provê outra abordagem baseada em incentivos e Bergstrom (1989) usa
informação assimétrica. Abordagens mais modernas, como a da teoria dos leilões,
podem também ser utilizadas. Um concurso pode ser visto como um chance
auction1
com preço de reserva, em que os candidatos oferecem lances, equivalentes ao
esforço despendido em aprendizagem, e auferem em troca uma probabilidade de ser
aprovado no concurso. Quanto maior o lance, maior será a probabilidade de ser
aprovado, de forma que se estabelece um critério de dominância estocástica
(Benegas 2009).
Os
trabalhos empíricos sobre o tema, em geral, versam sobre aplicações de modelos
de escolha discreta para determinar os fatores que influenciam o desempenho de
alunos em cursos formais; ou numa situação de concursos, como o vestibular no
Brasil, ou provas similares em outros países. A seguir faz-se uma breve resenha
de trabalhos que se assemelham ao que se pretende desenvolver neste estudo.
Spector
& Mazzeo (1980) avaliaram a efetividade de um novo método de ensino em um
curso intermediário de macroeconomia. Para tanto, usaram um modelo de escolha
binária probit, onde a variável dependente utilizada foi o conceito final no
curso. Como regressores foram usados a nota média de admissão do aluno, a
pontuação obtida em uma prova de conhecimentos prévios aplicada no início do
curso e uma variável dummy para representar a diferença entre o novo
método e o tradicional.
Brasfield
et al. (1993), usam a estrutura educacional, adaptada numa função de produção,
e um modelo probit para avaliar a importância do estudo de economia no curso
secundário para o desempenho dos alunos de turmas introdutórias de economia na
Murray State University. Nesse estudo os autores encontraram uma relação
positiva entre os alunos que tiveram aulas de economia no secundário e suas
notas nas classes introdutórias de macro e microeconomia.
Wood
& Doyle (2002) usaram dados de um teste aplicado para empregados de grandes
corporações norte-americanas. Os autores modelaram o número de respostas
corretas como um processo de Poisson, com média condicional e variância
determinadas por um vetor de variáveis explicativas. A variável dependente
representava o número de questões corretas e como variáveis explicativas foram
utilizadas dummies para gerência e outros cargos ocupados pelos
empregados, níveis de educação, faixas de renda, origem (hispânica,
afro-americana e asiática), faixas de idade, sexo, identidade política (liberal
ou conservador), tipo de graduação e se o empregado em algum momento cursou uma
disciplina de economia.
Os
resultados obtidos revelam que um melhor desempenho nas respostas do
questionário está associado a um maior nível de educação, ter feito disciplina
de economia na faculdade, ter renda mais alta e ser do sexo masculino. As
outras variáveis explicativas mostraram-se insignificantes.
Borg
& Stranahan (2002) testaram se a personalidade é uma variável importante
para explicar desempenho em cursos avançados de economia. O que estes autores
queriam comprovar era se estudantes introvertidos se saem melhor do que
estudantes extrovertidos. Para testar a hipótese aventada os autores usaram um
modelo probit, onde os intervalos das notas nas provas foram utilizados como
variável dependente. As variáveis explicativas foram dummies para sexo,
raça, tipo de disciplina que cursava (macro, micro etc.), existência de monitor
para a disciplina e os oito tipos de personalidades identificadas pelo Briggs
Type Indicator (MTBI). Os autores concluíram que o tipo de personalidade é uma
variável importante na explicação do desempenho de estudantes nos curso de
economia; confirmando, portanto, a hipótese formulada.
Robb
& Robb (1999) procuraram identificar o motivo do declínio do número de
matrículas nos cursos de economia nos EUA e no Canadá. Para tanto, eles
consideraram que a decisão do estudante em cursar economia envolve dois
estágios. No primeiro estágio o estudante decide fazer economia no primeiro ano
da universidade; e, no segundo estágio, o estudante decide se vai continuar a
cursar economia depois dos estudos introdutórios.
A
estrutura da estimação foi desenvolvida em duas etapas. Na primeira foi feita
uma estimação de mínimos quadrados, em que a equação tinha como variável
dependente a nota do aluno na disciplina de microeconomia e como variáveis
explicativas um vetor de características dos estudantes, um vetor de
características dos professores e dummies para alunos que estudaram
cálculo, álgebra e outras disciplinas de economia.
Na
segunda etapa da estimação os autores usaram um modelo probit, com a equação de
regressão explicando se o estudante segue ou não no curso de economia. As
variáveis explicativas utilizadas nesta segunda etapa foram as notas no curso
introdutório, um vetor de características dos estudantes e um vetor de
características dos professores.
Emilio
et al. (2004) analisaram os determinantes do acesso à Universidade de São
Paulo. O modelo utilizado foi um probit, corrigido pelo viés de seleção, com
variável dependente definida como a probabilidade de sucesso no vestibular e um
conjunto de características sócio-econômicas como variáveis explicativas. As
principais conclusões do trabalho mostram que os fatores mais importantes para
o sucesso no vestibular são a educação dos pais e o tipo de escola que os
candidatos frequentaram. Os autores constataram ainda que o viés de seleção
causa alterações nas magnitudes dos coeficientes estimados mas não muda seus
sinais nem a significância estatística.
3.
BASE DE DADOS
No
concurso foram aplicadas provas objetivas de Língua Portuguesa, Matemática,
Conhecimentos Gerais e Conhecimentos Bancários. Exigia-se ainda que o candidato
fosse maior de 18 anos e houvesse completado o ensino médio.
Com
base nas características do concurso e num questionário sócio-econômico,
preenchido no ato da inscrição, foi definido um conjunto de variáveis que
poderia explicar o desempenho dos candidatos. Descreve-se, na Tabela
1, este conjunto de variáveis binárias que comporá o vetor de variáveis
independentes, com suas definições e o sinal esperado de cada um dos seus
efeitos marginais.
Observa-se
que existem quatro categorias para classificar o grau de instrução de cada
candidato; a saber, ensino médio, universitário incompleto, universitário
completo e pós-graduação. Portanto, quando a variável EMED assume o valor um,
ela exclui todas as outras três categorias. Já quando a variável ESUPO assume o
valor um, ela exclui duas categorias – ensino médio e superior incompleto.
O
efeito marginal do estado civil é, a princípio, ambíguo. Ao mesmo tempo em que
um indivíduo casado tem o seu tempo de estudo limitado por obrigações
domésticas, inexistentes para um indivíduo solteiro, ele deve encontrar maior
motivação para ser aprovado no concurso e assim melhorar a sua situação
familiar. O raciocínio inverso deve ser verdadeiro para um indivíduo sem
vínculos conjugais.
A
definição de desempregado usada aqui não deve ser confundida com a noção
tradicional de desemprego formal ou friccional. Cabe observar que na pergunta
do questionário sócio-econômico, que trata da condição no mercado de trabalho,
não havia uma alternativa referente a estar desocupado; ou seja, não estar
procurando emprego. Assim, dentre os que se denominaram desempregados é provável
que haja uma parcela razoável que tenha optado por se dedicar aos estudos antes
de entrar no mercado de trabalho, ou para retornar a esse mercado em melhores
condições de colocação ou remuneração. Por conta disso, resolveu-se fundir as
categorias de desempregados e estagiários numa só. A ideia é juntar categorias
de pessoas que dispõem de tempo para o concurso maior do que a média dos demais
candidatos. Verifica-se posteriormente se esta escolha foi acertada.
Vale
ainda lembrar que a definição do corte para as variáveis renda familiar e
pessoal foi baseada num índice de desempenho preliminar. Tal índice foi, a
princípio de maneira ad hoc, definido como a razão entre percentual de
candidatos aprovados num determinado intervalo de renda e o percentual do total
de candidatos no mesmo intervalo. Então, os cortes de 2 e 10 salários mínimos,
foram estabelecidos de acordo com a condição do índice preliminar de desempenho
ser menor ou maior do que a unidade. Por outro lado, os dados da PNAD de 2003,
ano do concurso, mostram que 81% das pessoas ocupadas no Nordeste ganham até 2
salários mínimos mensais e 96,5% das famílias ganham menos de 10 salários
mínimos. Portanto, o índice de desempenho reflete com fidelidade pessoas ou
famílias mais ou menos abastadas para o padrão da região.
4.
METODOLOGIA
A
explicação da probabilidade de sucesso num concurso é um caso típico de modelo
de escolha binária. Assim, a equação que modela esta probabilidade é definida
como,
Onde
X é o vetor de variáveis explicativas, definidas anteriormente, F é uma
função cumulativa de probabilidade e β é um vetor de parâmetros que
ultrapassa a dimensãode X por um termo que representa o intercepto.2
Há
problemas na estimação desses modelos semelhantes aos encontrados em modelos de
regressões em geral. No
entanto, estes problemas podem, em alguns casos, ter consequências mais graves
do que em modelos tradicionais. Particularmente, este trabalho se preocupa com
quatro tipos de erros comuns na especificação destes modelos. O primeiro é o de
viés de seleção, ou erro de especificação na seleção da amostra. O segundo
refere-se à omissão de variáveis explicativas, no qual se inclui o problema da
heterogeneidade não observada. O terceiro tipo versa sobre a determinação
simultânea das variáveis; ou seja, variáveis do lado direito da equação
requerem equações adicionais para explicá-las. Finalmente, o quarto tipo de
erro é sobre a especificação funcional; isto é, a função de probabilidade
escolhida pode não ser a mais adequada. Comenta-se a seguir cada erro
individualmente e as soluções propostas para contorná-los.
Especificamente,
o viés de seleção emerge nesse caso porque anteriormente indivíduos tomaram a
decisão de inscrever-se, ou não, no concurso. A questão crucial, portanto, é
decidir até que ponto essa escolha prévia influencia a explicação do resultado
do concurso.
O
viés de seleção é prejudicial aos estimadores dos parâmetros de uma regressão
quando as características não observáveis que afetam a seleção são
correlacionadas com as características não observáveis que afetam a variável de
interesse. Em outros termos, isto é equivalente à existência de correlação
entre as características não observáveis do mecanismo de seleção e o erro da
regressão (Vella 1998). Devido a essa correlação é necessário introduzir na
regressão que explica o sucesso no concurso um termo de correção proveniente da
modelagem do processo decisório de inscrição (Emilio et al. 2004). Nesse
trabalho, preferiu-se não modelar a decisão prévia. Na apresentação dos
resultados empíricos justifica-se a razão de não fazê-lo e qualificam-se os
resultados obtidos à luz de possíveis vieses.
Na
equação definida em (1) a probabilidade de sucesso em um concurso é modelada
como função de um vetor de atributos, incluindo variáveis de grau de instrução.
Portanto, não é possível observar a habilidade específica de cada candidato.
Mesmo se fosse possível observá-la seria difícil mensurá-la, embora o quociente
de inteligência (QI) seja uma boa proxy para habilidade.
No
entanto, como a heterogeneidade não observada enquadra-se no caso mais geral de
erro de omissão de variáveis, existe uma estratégia para testar a sua
existência ou, mais importante, testar se a sua ocorrência é danosa para a
estimação. O teste de White (1980) para heterocedasticidade é também um teste
para erro de especificação. Portanto, um teste de White, caso se comprove a
ausência de heterocedasticidade, poderá indicar também se a omissão é danosa
para o processo de estimação.
Existe
também a possibilidade de endogeneidade das variáveis do lado direito do
modelo. Renda do candidato, renda da família, nível educacional e mesmo estado
civil podem ser simultaneamente determinadas. Contudo, é extremamente
improvável que os erros das equações que determinam estas variáveis sejam
correlacionados com o erro da equação que explica o sucesso no concurso (Sargan
1975). A razão para isto é que cada uma dessas variáveis é determinada em
diferentes mercados, como as rendas; ou por diferentes mecanismos de formação,
como o grau de instrução e o estado civil. Portanto, o que se presume, é que
exista correlação entre estas variáveis, mas não a existência de viés de
simultaneidade.
O
último tipo de erro de especificação a ser discutido é o do formato da escolha
funcional. As formas funcionais mais populares para tratar variáveis
dependentes binárias são os modelos probit e logit. Embora estes modelos
forneçam resultados muito similares, nem por isso deve-se negligenciar um teste
sobre a escolha funcional, principalmente pelo motivo da amostra nesse problema
apresentar um número de valores nulos de Y substancialmente maior do que o
número de 1's. Discriminar entre estes dois formatos requer um teste de modelos
não entrelaçados. Silva (2001) mostra que, sob condições adequadas de
regularidade, hipóteses alternativas sobre forma funcional em modelos binários
podem ser entrelaçada em um modelo dado por
onde
L denota máxima verossimilhança. Para ρ= 1 a equação acima transforma-se em:
que
é uma combinação linear convexa das formas funcionais alternativas e a decisão
sobre a melhor hipótese recai sobre o valor de α.3
Este teste tanto é adequado para discriminar entre os modelos probit e logit,
como para contrastar um desses modelos com um modelo de categoria assimétrica,
como o gompit, por exemplo.
5.
RESULTADOS EMPÍRICOS
Para
explicar o resultado do concurso escolheu-se em (1) a função logit para
representar F. O modelo foi estimado através de Máxima Verossimilhança e o
algoritmo de maximização precisou de 10 interações para convergir. O valor da
razão de verossimilhança para testar a restrição de que todos os coeficientes,
exceto o intercepto, são iguais a zero foi de 453,3. O ponto crítico para, uma
qui-quadrado com 9 graus de liberdade, dado um nível de significância de 5%, é
de 16,9. Portanto, rejeita-se a hipótese de que conjuntamente as variáveis
independentes não exercem influência sobre a probabilidade de sucesso no
concurso.
Além
do R2 de McFadden, o qual é extremamente baixo nesse caso,
outra medida de ajustamento é o percentual de valores corretamente preditos, o
qual fornece o percentual corretamente predito de 1's, quando a probabilidade é
maior do que um certo valor crítico; e de zeros, quando a probabilidade é menor
do que este valor.
Usualmente
este valor crítico é estabelecido como 0,5. No entanto, neste problema
específico, como a proporção de zeros é substancialmente maior do que a de 1's,
usou-se a probabilidade empírica de passar no concurso; ou seja, 0,00266. Assim
a proporção de valores corretamente preditos para Y=1 é de 61.26% e a proporção
de valores corretamente preditos para Y=0 é de 74,27%.Tais resultados levam a
um valor ponderado de predições corretas de 61,29%. No entanto, é razoável ter
em mente que medidas de ajustamento em modelos de escolha binária não são
importantes nem do ponto de vista estatístico nem do ponto de vista econômico
para avaliar a significância das variáveis explicativas (Wooldridge 2002). O
teste da razão de máxima verossimilhança e os testes individuais de
significância são tudo que se precisa para avaliar o modelo.
A
razão entre o coeficiente estimado e o erro padrão representa uma estatística
distribuída assintoticamente como um normal padrão. Esses valores são
utilizados para a realização do teste de hipótese sobre a significância
estatística de cada um dos parâmetros estimados. Como pode se observar na Tabela
2, somente a variável referente ao estado civil (SOLT) não se mostrou
significativa, ao nível de 5%.
Quanto
aos resultados para as outras variáveis estes são agrupadas em blocos, por um critério
de similaridade, e seus efeitos marginais são comentados individualmente.
5.1
Determinantes Gerais: Local de Origem, Faixa Etária e Situação no Mercado de
trabalho
Os
resultados apontaram um efeito marginal positivo sobre a chance de aprovação no
concurso para os candidatos originários de regiões metropolitanas.
Pode-se
afirmar que o elemento diferencial desse determinante é a maior quantidade e
melhor qualidade dos serviços ligados à educação e à cultura nos grandes
centros urbanos, vis-à-vis os municípios do interior.
No
quesito faixa de idade os resultados apontaram um efeito marginal positivo
sobre a chance de aprovação no concurso para os candidatos na faixa de 18 a 22 anos. Este resultado
pode ser justificado com base na argumentação de que estes candidatos possuem
um melhor ritmo de estudo, por estarem ainda frequentando aulas ou por terem
parado de estudar há pouco tempo.
Um
efeito marginal positivo sobre a chance de aprovação dos candidatos que estão
desempregados ou são estagiários significa que essa condição no mercado de
trabalho possibilita uma maior disponibilidade de tempo para dedicação aos
estudos, o que vai se traduzir em uma maior chance de aprovação.
Com
vistas a dirimir a dúvida sobre juntar estagiários e desempregados numa só variável,
estimou-se a regressão separando as duas categorias. Os resultados mostram que
os coeficientes para estagiários e desempregados têm o mesmo sinal positivo e
não há diferença estatística sensível entre eles. Portanto, juntá-las acarreta
o benefício adicional de redução na variância dos estimadores, pois isto
equivale a estimar o modelo sob restrição.
5.2
Determinantes Relacionados à Renda: Renda Pessoal e Renda Familiar
Dispor
de renda pessoal baixa produziu um efeito marginal negativo sobre a chance de
aprovação. Este resultado está em conformidade com a argumentação de serem
piores as condições para os que têm baixos rendimentos, visto que essa situação
é limitante do acesso a materiais de estudo e a cursos preparatórios de
qualidade. Fica clara, portanto, a relevância do acesso a produtos e serviços
que reforcem, ou complementem o aprendizado já adquirido; ou que iniciem os
candidatos em temas desconhecidos, como os exigidos na prova específica de
conhecimentos bancários, por exemplo.
Possuir
uma renda familiar alta redunda num efeito marginal positivo sobre a chance de
aprovação. Todo o backgroud dos candidatos oriundos de famílias de maior
renda sugere o perfil de uma pessoa que cursou ensino formal de qualidade, com
acesso a materiais didáticos e para-didáticos, ambiente propício ao
desenvolvimento cognitivo, maior volume de informações, acesso a atividades
extracurriculares, inclusão digital, e a outros elementos materiais e
intangíveis. Todas estas características contribuem, naturalmente, para uma
maior chance de aprovação no concurso.
5.3
Determinantes Relacionados à Educação Formal: Graduado ou Pós-graduado, Ensino
Médio e Ensino Médio em
Escola Privada.
Os
candidatos com formação além do ensino médio, ou os "super-educados",
apresentam efeito marginal positivo sobre a chance de aprovação. Isso reflete,
fundamentalmente, uma maior maturidade intelectual e conhecimento mais vasto
sobre temas cobrados nas provas que iam além do que é ministrado no ensino
médio.
Contudo,
não se pode desprezar o fato de que num concurso que exige nível médio, no qual
participaram praticamente 80.000 candidatos universitários, mais de 35.000
graduados e aproximadamente 5.600 pós-graduados, 28,5% das vagas ofertadas
ficaram ociosas.
Ou
seja, de um universo de cerca de 120.600 candidatos que são pelo menos
universitários, somente 519 cumpriramos requisitos mínimos para serem aprovados
no concurso, os demais perderam para si mesmos. Portanto, há uma forte
evidência de que o baixo nível da qualidade do ensino tem transbordado para o
nível superior.
O
efeito marginal sobre a chance de aprovação de candidatos que cursaram apenas o
nível médio foi negativo. Além de influenciar inversamente a probabilidade de
passar no concurso, esta variável foi também a que produziu maior efeito
marginal em valor absoluto. Este resultado se deve fundamentalmente à baixa
qualidade do ensino médio público e à concorrência com candidatos
universitários, ou até mesmo pós-graduados.
Ter
cursado o ensino médio em escola privada apresentou efeito marginal positivo na
chance de aprovação. Este resultado, como o anterior, também se deve às
condições precárias do ensino público de nível médio e à ascensão da escola
privada, onde são ofertadas metodologias de ensino, ambiente de estudo e acesso
a materiais didáticos complementares incomparáveis com aqueles disponíveis na
rede pública.
Outra
medida interessante que pode ser extraída da estimação do modelo é a do risco
relativo, o qual mede a razão das probabilidades de sucesso, condicionadas a
uma série específica de atributos (King & Zeng 2001). Assim, calculou-se a
razão de probabilidades entre um indivíduo típico e um indivíduo atípico
passarem no concurso. Isto corresponde, grosso modo, à razão entre
probabilidades de um indivíduo rico e um indivíduo pobre obterem sucesso. A
razão calculada foi de 41,14, o que significa que um indivíduo de boa situação
financeira familiar, jovem, universitário ou pós-graduado, oriundo de região
metropolitana e que cursou escola básica privada, tem cerca de 41 vezes mais chance
de passar no concurso do que um indivíduo que não possui estes atributos.
5.4
Testes de Especificação
Para
avaliar problemas de especificação no modelo dois tipos de teste foram
realizados. O primeiro foi o teste de heterocedasticidade. Vale lembrar que
modelo logit é essencialmente heterocedástico e sua estimação, através de
mínimos quadrados não-lineares ponderados, leva em conta este fato. Portanto, o
teste deWhite, neste caso, temcomo objetivo central investigar uma possível
omissão de variáveis. Como a suspeita sobre o erro de especificação recai sobre
a ausência de uma medida de habilidade na equação, optou-se por definir o vetor
que modela a variância do erro como constituído apenas das variáveis de
instrução
O
resultado deste teste, baseado na regressão auxiliar apresentada no Apêndice Apêndice
A, mostra que o valor calculado para o teste de Lagrange é de 0,62. Já o
valor crítico da distribuição qui-quadrado, a um nível de significância de 5% e
com dois graus de liberdade, é de 5,99. Portanto, é aceita a hipótese nula de
homocedasticidade; o que aqui significa, em última análise, uma indicação de
que se houve omissão de variáveis esta não é danosa. Este resultado pode
parecer surpreendente à primeira vista; no entanto, é em essência o mesmo
encontrado por Griliches & Mason (1972), os quais não encontraram indícios
de correlação entre habilidade e escolaridade.
O
segundo teste, referente a erro de especificação, foi o da forma funcional.
Apesar da argumentação de alguns autores (Train 2003) de que os modelos probit
e logit são empiricamente indistinguíveis, existem situações em que eles podem
divergir, requerendo nestes casos um teste formal de escolha. Portanto,
realizou-se um teste para discriminar entre os modelos logit e probit. Assim, o
modelo probit foi estimado e seus resultados são apresentados no Apêndice Apêndice
B, já o resultado do teste é apresentado no Apêndice Apêndice
C. Como o valor do coeficiente da variável Z, correspondente a na
equação (3), é estatisticamente insignificante, não se rejeita a hipótese do
modelo logit ser correto.
Escolher
o modelo logit tendo como alternativa o modelo probit não leva à conclusão de
que o primeiro é o mais apropriado. Realizou-se, então, o teste tendo como
alternativa uma distribuição gompit, representativa da classe assimétrica.
O
resultado do teste para discriminar entre o logit e o gompit, mostrado no
Apêndice Apêndice
D, indica que o coeficiente estimado de Z é estatisticamente insignificante
ao nível usual de 5%. Portanto, pode-se ter uma razoável confiança de que a
forma funcional escolhida foi bem especificada.
Existe
ainda a possibilidade de que as estimativas obtidas estejam sendo afetadas pelo
viés de seleção, mencionado anteriormente. A alternativa para corrigi-las seria
construir uma amostra censurada, com dados da PNAD, e modelar também o processo
de inscrição (Emilio et al. 2004). No entanto, existem duas razões para não
fazê-lo.
A
primeira delas é a de que no questionário respondido pelos candidatos não há
informação sobre o estado ou cidade de origem do entrevistado. Isto geraria
certa imprecisão na construção de uma amostra que também incluísse pessoas que
não se inscreveram no concurso.
A
segunda é que a correção do viés de seleção usando dados de uma base diferente
como a PNAD por si só não é garantia de bons resultados.4 Um exemplo de uso da PNAD para este fim, onde aparecem
distorções inaceitáveis, pode ser constatado em Duarte & Silveira (2009).
Portanto,
os resultados aqui apresentados devem ser vistos com a necessária prudência.
Como o interesse principal deste artigo é distinguir diferenças de desempenho
entre indivíduos com uma dotação de características superior a de indivíduos
menos afortunados, um viés sistemático dos coeficientes não alteraria o
ordenamento do desempenho e não comprometeria a substância dos resultados. Já
um viés errático poderia mudar fundamentalmente as conclusões obtidas.
6.
CONCLUSÕES
Após
a especificação de um modelo logit, onde a probabilidade de sucesso no concurso
foi definida como função de umvetor de atributos sócio-econômicos, constatou-se
que alta renda familiar, escolaridade acima do ensino médio, ser oriundo de
região metropolitana, ter cursado o ensino médio em escola privada e ser jovem,
são fatores que contribuem para aumentar a chance de passar no concurso. Por
outro lado, ter renda pessoal abaixo de dois salários mínimos e ser detentor
apenas de escolaridade de ensino médio contribui negativamente para aprovação
no concurso. Constatou-se ainda que a variável ensino médio apresenta o maior
efeito marginal em termos absolutos, o que dramatiza a situação dos candidatos
de baixa escolaridade.
Delineia-se
assimo perfil de umcandidato jovem, pertencente a uma classe média de renda
relativamente elevada, habitante de região metropolitana e que teve acesso à
instrução e a meios culturais de qualidade como elemento típico de quem obteve
sucesso no concurso. Este indivíduo, pela medida de risco relativo, tem 41
vezes mais chance de aprovação do que um indivíduo sem estes atributos. Existe,
portanto, uma evidência razoável de persistência do status econômico de uma
geração para outra.5 Aliás, é relevante frisar, que uma análise qualitativa dos
resultados do ENEM para o ano de 2003 mostra conclusões inteiramente similares
às obtidas neste trabalho (Veloso 2004).
Obviamente,
não é papel do sistema educacional preparar alunos para concursos, seus
objetivos precípuos vão muito além disso. No entanto, deve haver certa
conformidade entre a escola e o mercado de trabalho. Nesse sentido, investir na
qualidade do ensino médio público pode ser uma política que ajude a
contrabalançar os efeitos perversos das diferenças de dotações iniciais dos
indivíduos. Ao contrário de políticas afirmativas, como a do sistema de quotas,
com efeitos predominantemente de curto prazo, apostar numa política educacional
de longo prazo pode ser uma maneira de amenizar o quadro de desigualdades que
permeia o meio social brasileiro, e nordestino em particular.
Por
outro lado, a presença de candidatos com qualificação além da requerida no
concurso revela o fenômeno caracterizado como overeducation (Rumberger
1981). Preponderantemente esse fenômeno ocorre por desequilíbrios entre o
mercado de trabalho e o sistema educacional, ou pela baixa qualidade deste
último. As evidências apontam para a improdutividade, para os baixos salários e
para a permanência dos indivíduos em situação de overeducation (Groot
1996). Portanto, preencher postos de trabalho, que requerem apenas educação de
nível médio, com detentores de título universitário ou com pósgraduação, aponta
para uma alocação ineficiente dos recursos públicos conjugada a uma falha
estrutural do mercado de trabalho e do sistema de ensino regional.
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1
Também conhecido como leilão chinês.
2
A justificativa econométrica desta equação pode ser derivada de um random
utility model (Train, 2003);
3
Esta forma de entrelaçar é equivalente àquela proposta por Davidson e Mackinnon
(1993);
4
Embora que, ao preservar a significância e a ordem de grandeza dos
coeficientes, a correção de Emílio, Belluzo e Alves (2004) mostre-se robusta;
5
Este fenômeno de persistência é notado por Stokey (1998) para a realidade
americana.